quinta-feira, 9 de junho de 2011

Lenda da minha Terra


Lembro-me do Chagas aparecer na taberna da minha Avó. Sempre que ele entrava ela dizia “Deus te valha… Já nem consegues segurar um copo de vinho”…

O Chagas era um velho homem de aspecto sinistro, com a cara vermelha e cheia de cicatrizes (que diziam existir por todo o corpo), o cabelo escuro, os olhos vazios e perdidos no longe do fundo de uma garrafa. E tremia! Tremia tanto que o copo tinha que estar meio vazio para não verter.

Um dia a minha Avó explicou-me porque razão tremia o Chagas:

O Chagas andava sempre com uma companhia de fama duvidosa, de seu nome José e alcunha o “cinco m’é reis”. Homem estranho e sem ofício que vagueava pela terra a aproveitava-se dos corações moles para comer. Fosse pedindo, ou fosse roubando.

Numa noite de Maio, quente e pouco depois de desaparecer a luz do Sol, espelhava a luz da Lua em ramos e terras da Azenha.

Ia meu bisavô Rodrigues – pai de minha avó, homem grande no tamanho, no coração e no mau-feitio – na companhia de seu amigo Pombo, descendo a Azenha junto à ponte do Mondego. Montados em seus cavalos, fumavam descontraidamente e falavam do negócio. Marchantes os dois, tinham vindo da feira do mês em Santa Comba. O negócio tinha corrido bem e os bolsos vinham recheados pela primeira vez desde que tinha começado e acabado a Guerra.

José e o Chagas, sabendo que a feira tinha corrido bem, decidem tentar a sorte e montam atalaia junto à curva da ponte, onde sabem ir passar os dois feirantes. Esperam armados, porque sabem que a resistência será grande, e com uma faca e uma pistola de dois tiros esperam encobertos na sombra de um centenário carvalho.

Ao verem passar o Rodrigues e o Pombo, saem da “toca”, e o Cinco M’é Reis grita empunhando a pistola: “A bolsa sem demora! Ou chumbo quente vai voar!”

Assustados com o puxar das rédeas os cavalos relincham mas param.

- Tens a certeza do que queres? – Pergunta o Pombo.

- A bolsa ou voa chumbo! – Volta a gritar José. E o Chagas, de faca na mão apontada ao meu Avô, treme de medo. E de fome…

- Também tu Chagas?! Cospes no prato em que comes?! Quantas vezes te matei a fome, miserável!

- A bolsa! – Diz o Chagas a medo…

E nesse preciso momento o Pombo empina o cavalo. Um Lusitano pequeno mas robusto e bem treinado. José cai no chão, com a arma longe, na escuridão, e o Chagas tenta fugir. Mas a sorte dos dois termina ali…

José tenta lutar com o Pombo. Saca de uma pequena navalha de poda, mas nada pode contra a faca do Marchante, que com um movimento firme lhe passa o fio na mão, obrigando-o a deixar cair a navalha. O Cinco M’é Reis esgueira-se a correr pelo caminho velho do Mondego, mas não sem antes sentir a ponta de uma bota cardada a entrar pelas costelas, acompanhada de um crepitar e uma dor violentíssima que o deixou quase sem respirar… Foi visto apenas dois dias depois, ainda a tossir sangue. E dizem que nunca mais conseguiu respirar em condições até morrer, poucos anos depois…

O Chagas… Esse tentou fugir, mas quase em voo, como o falcão sobre a rola, o meu Avô apanhou-o. Tentou resistir… Mas nada conseguiu fazer o seu pequeno corpo contra o Rodrigues que mais parecia um gigante. Murros e pontapés empurraram-no para a ponte, e junto ao muro viu-se de cabeça para baixo vendo o Mondego a correr lá em baixo no vale. A vontade de meu Avô era deixa-lo cair para que pagasse pela traição…

- Patrão, misericórdia! Pelo amor de Deus! Pela saúde da sua filhinha!

- Miserável! Mereces a morte de um traidor!

- Patrão poupe a vida deste criado mal-amado por Deus! – Disse o chagas a chorar como um menino, e a tremer como um salgueiro com Vento de Norte…

Tocado pelas lágrimas de um homem e pela mortandade que jurara não voltar a fazer, meu Avô puxou-o e atirou-o para a estrada, fora da ponte.

-Some-te miserável! E nunca mais me apareças à frente porque se Deus é minha testemunha, eu mato-te se te vejo perto de mim, da minha família ou dos meus amigos! Some-te!

Mas o Chagas não se conseguia mexer… Todo o corpo tremia, e cada vez que se tentava levantar caía desamparado… Tal não era o terror que o assombrava…

Sem pena do maltrapilho, o Pombo e meu Avô Rodrigues continuaram a viagem para o Ervedal. Mas desta vez calados e pensativos fizeram o caminho com a lembrança da cara de terror do Chagas.

Desde esse dia que o homem não parava de tremer… Fugia de meu Avô, e dizem que só no caixão parou e descansou.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Luto da Alma


Falo-vos sobre a morte do que é imortal. Falo-vos sobre o Luto da Alma, num ser onde o Espírito já há muito morreu.

Dizer tristeza é ser brando com a sensação de dor, angústia e revolta que escurece a Alma na minha vida… É não compreender a sensação de morte quando tenho que olhar dois olhos, ou quando tenho que pensar e escolher…

Do Luto poderia falar sobre Luta… A Luta da Alma… Mas mesmo a luta já há muito parou. Parou no momento em que a desonra e a falta de lealdade mancharam a vida, numa luta desigual com a sensação que se vestiu de sentimento.

Força já quase não existe. Existe cansaço e solidão. Imobilidade… A sensação de dormência e torpor que todos os dias se apodera de mim logo ao acordar. A vontade de não me mexer, tal como um animal ferido não se mexe para tentar sobreviver, guardando a pouca energia apenas para respirar e manter o coração a bater.

Ao escrever sinto os olhos pesados, e surge a vontade de os fechar. A mente foge e o corpo procura ficar quieto. A coragem não existe e o peso é o da Alma. O peso que me afunda e me faz desistir. O peso dos espíritos que pairam sobre a mente que descobre a razão e a ela chama de sentimento. O peso dos espíritos que choram de raiva e angústia, e ódio… e desespero por tudo o que fizeram; e por tudo o que não fizeram…

Não quero mais saber… Vivo apenas porque sim… As escolhas alguém que as faça por mim, porque eu já não sou capaz. Quero apenas ficar quieto e sozinho. Respirar e sobreviver, se me for possível…

Pela janela procuro dois olhos para tentar viver, para tentar ter a coragem de me mexer. Mas não estão lá, nunca estiveram… Fruto não sei bem de quê, foram eles que mataram a minha Alma, numa busca da Loucura.

Não sou digno… Sou miserável na minha condição: corpo sem Espírito, e com a Alma Negra… De luto constante… Miserável… À procura de dois olhos escuros que, com o seu brilho, iluminem o caminho da minha Alma no Luto e na Luta. Dois pequenos olhos que na sua pureza não me julgam, não me censuram nem me trespassam.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Lembro-me


Lembro-me de ser pastor, isolado nas serras, onde só via Homens quando a Mãe Terra com a neve e a chuva me obrigava a procurar abrigo…
Falava com a águia e com o cordeiro, bebia água do rio ou dos troncos ocos, e comia o que a terra me dava… A minha arma era o meu cajado, e o meu inimigo era o Lobo.
Um dia vieram homens estranhos que vestiam couro e metais brilhantes. A morte desceu dos céus… Queriam que desse os meus animais e as minhas peles! Queriam que oferecesse tudo a um César e a um Júpiter, e que obedecesse aos que vieram com eles… Tiraram-me a minha liberdade, não podia mais andar pelos montes ou falar com a águia.
Como eu havia muitos, e muitos morreram… Ouvi um dia as palavras sábias de um homem a quem chamavam o Lusitano. Juntei-me a ele, e de pastor passei a guerreiro; deixei o cajado e segurei a espada.
Lutei com valor a seu lado, vencemos muitas batalhas, e uma mão cheia de pastores ensinou a guerra ás Legiões. Mas a sedução foi maior para alguns, e veio a traição. Morremos os dois pela Espada, tal como vivemos…

Lembro-me também de um dia acordar vestido com serapilheira e metal pobre, a segurar uma lança. Nas minhas vestes tinha o azul e o branco pintados.
Olhei para trás e vi um homem pequeno de tamanho, mas enorme na altivez. Montava um cavalo branco, usava metal brilhante e uma espada do seu tamanho, no seu escudo estavam cores iguais ás minhas.
Lutamos lado a lado, dias sem fim, em frente a um grande castelo a que mais tarde demos o nome de um santo. Ao fim de alguns meses conseguimos entrar no castelo, por cima do corpo de um amigo. Lutámos nas ruas contra homens de branco, tez escura, e com armas estranhas, e no fim ajudei o cavaleiro a entrar no palácio… Foi um bom dia…
Agradecido com a sua ajuda fez-me seu pajem. Mas um dia enviou-me com outros á procura de um homem a quem chamavam santo. Vestimos um manto branco com uma cruz vermelha. Deram-nos ordens e uma Regra dura de cumprir, mas mesmo assim seguimos os cavaleiros de branco.
Um dia o homem a quem chamavam Santo falou comigo. Disse ser um dos Irmãos de Hugo de Payens. Ensinou-me a lutar a cavalo e a pé, com tudo e sem nada.
Fez de mim cavaleiro, e também eu usei o escudo e as vestes brancas numa terra longínqua, onde o calor e o vento me traziam cheiros doces e amargos que nunca senti…
Lutei e quase morri nas mãos de guerreiros iguais aos do castelo. Fui preso. Passei fome e sede. Até que um dia me libertaram com um irmão numa terra sem nome. Sem água e sem comida rezámos pela vida… Mas a morte chegou primeiro…

Mais tarde lembro-me de acordar num comprido e fundo buraco, onde a lama se misturava com humanos dejectos. O cheiro putrefacto misturava-se nas nuvens com o cheiro a pólvora, e pairava sobre campos de morte.
Tinha galões nos ombros, mas pouco me valiam… Tudo acabava à minha volta em bolas de fogo. Vi homens velhos a chorar, vi homens novos a ficar velhos, e a todos vi desaparecer no ar em bolas de fogo e terra…
Lutámos de noite e de dia. Gente que não conhecíamos mandou-nos matar e morrer… E ninguém percebia porquê… Chamaram-lhe uma Grande Guerra… Mas de grande só teve a Morte… Não me lembro de um dia em que não tenha chorado por viver…

Ontem acordei quase sozinho à beira de um caminho no meio da selva. Estava quente e húmido, mal se conseguia respira. As roupas pesavam e as armas já faziam feridas nas mãos… O ambiente era tão pesado, que parecia que a própria selva nos queria comer.
Esperámos 2 dias por homens que não vieram, até que os caçadores se tornaram presas quando por trás de nós no meio da selva surgiram fantasmas em figuras de Homens…
Durante 2 horas o barulho das armas não parou… Sozinhos, o apoio nunca chegou… A protecção a Generais era mais importante! Aviões e helicópteros não chegavam lá…
Ferido vi cair um, depois outro, e mais um… Depois, tal como começou acabou, e leves como vieram, os fantasmas desapareceram no mato…
Andámos cinco quilómetros com os nossos ás costas, até sermos evacuados por alguém que preferiu ignorar ordens…
A minha revolta levou-me à cadeia . Uma prisão na mesma África da qual nunca saí… Aquela selva matou-me aos poucos, mas o Golpe de Misericórdia foi saber que a traição tinha matado os meus camaradas numa operação que nunca existiu…

Hoje acordo cansado e por vezes não sei onde estou. Fisicamente estou “aqui e agora”, mas cansado não consigo saber onde…
Ao fim de mais de dois mil anos continuo a lutar e a fazer “guerra”, mas desta vez sem armas e contra um Inimigo desconhecido ou indefinido…
Hoje luto contra a Mortalidade do Corpo e da Alma. Luto contra a resignação e o conformismo… Luto por Virtudes e Princípios que regem a minha vida…

Mas acima de tudo Luto contra mim e a minha própria hipocrisia e imperfeição…

sábado, 4 de dezembro de 2010

A Tristeza de um Adeus


A tristeza de um Adeus não se mede em lágrimas. Mede-se em corações partidos, em desespero e em palavras… Palavras que se dizem, mas acima de tudo palavras que nunca se disseram… E em silêncios…
As lágrimas que correm pela face abaixo não passam de líquido… Já não me afectam! Secam com o tempo ou limpam-se…
Por outro lado um coração partido mantém eternamente a sensação de ausência – perdeu um pedaço. E muitas vezes o pedaço que o fazia bater. E aí surge o desespero que nos faz desistir da luta, da paixão, dos ideais que nos movem…
Depois surgem as palavras, as mais poderosas armas que existem, e aí começa a violência na emoção e na sensação.
As palavras que nunca me disseste ferem-me mais do que mil punhais…
As palavras que nunca te disse rasgam a minha carne como dentes de um Lobo que luta pela vida… O arrependimento…
As palavras que nunca quiseste ouvir… Sinto-as como o metal frio que me atravessa o peito sem me matar…
As palavras que ouvi fornecem-te o sal que pões nas feridas que me fazes a sorrir…
E neste sofrimento desmedido, em que sensações se baralham com sentimentos, ignoras-me negando-me as tuas palavras, e do silêncio surge a dúvida aterradora, e o choro que não seguro. Mais uma vez elevas-te acima do que é humanamente possível, soltas-te das forças que unem a vida e a matéria, e assumes-te como uma Deusa… Que até sabes ser capaz de ser.
O teu medo faz-te cruel…
A ti que lês este texto, estejas onde estiveres, nunca deixes nada por dizer… Mas cuidado: as palavras depois de ditas não se podem retirar ou apagar

domingo, 14 de novembro de 2010

Frases Soltas...


Peço a Deus que me leve os Sonhos
Peço a Deus
Que me tire o orgulho de ser quem sou,
Que me dê a coragem de o continuar a ser
Ser desprezível na multidão do mundo, que toca vidas e Almas…
E não se deixa tocar…

À eternidade da Alma,
Que se perde no Universo
Reclamo a sensação do que já passou…
E nunca voltará…
À eternidade do Universo,
Reclamo a sensação do que habita e repete e se perde na minha Alma…

Um grito surdo de aflição
Ressoa num Vácuo Eterno que partilho com estrelas e Anjos.
Na imensidão do Cosmos
Se perde o grito que não se ouve…
E o olhar que nunca vê…

Uma ajuda que não chega
E um olhar que não vê,
Perdem-se no infinito do que já não conheço:
O sentimento…


Apenas um sentimento habita em mim... Quem conhecer sabe o que diz:


"Quando eu morrer batam em latas,
Rompam aos saltos e aos pinotes,
Façam estalar no ar chicotes,
Chamem palhaços e acrobatas!
A Fantastica letra desta extraordinaria musica
Que o meu caixão vá sobre um burro
Ajaezado à andaluza...
A um morto nada se recusa,
Eu quero por força ir de burro."


(dos Resistência - Fim)

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Desapareceu o sentimento

A sensação que me prendia a ti já não existe… Apenas a ressaca de uma ligação que nunca existiu… A sensação de impotência, desmaiado no teu sorriso, no teu olhar
Da sensação vou sentir falta. Mas só da sensação… Os Sentimentos não existem, são confundidos com mediadores químicos que teimam em existir e controlar o nosso comportamento.
Vou sentir falta do que nunca te disse e do que tu nunca me disseste; da agressão emocional constante, mas que teima em me fazer viver… Viver numa emoção que nunca existiu e que não passa sequer da imaginação e da amálgama fisiológica para a realidade… Uma realidade relativa que teima em marcar a existência…
Vou sentir falta do teu olhar. Do medo que ele transmitia… Desse medo que destruiu o nosso Futuro, sem sequer sabermos. Desse teu medo que se misturou com as palavras que nunca disseste, e com as atitudes que nunca assumiste. Atitudes e acções que sem querer deixaste passar para além do teu consciente, teimando sempre na racionalidade do que vês e do que sabes ao certo.
Abrimos mão da vida, apenas pela razão… Por essa razão… Apenas por essa razão que nos faz sofrer e nos afasta completamente. Cada vez mais… Por essa razão que nos faz ter medo de estarmos juntos, de nos tocarmos … Que nos faz ter medo da sensação…
A ti eu só digo: até nunca mais! Fazes com que morra aos poucos, tiras-me a vida para conseguires viver, para conseguires lidar com a contrariedade daquilo que mais profundamente desejas…

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

À Eternidade do que não muda...


Citando aquele que para mim é e sempre será um Grande Mestre, em tudo o que a vida me possa mostrar:

"Devo à paisagem as poucas alegrias que tive no mundo. Os homens só me deram tristezas. Ou eu nunca os entendi, ou eles nunca me entenderam. Até os mais próximos, os mais amigos, me cravaram na hora própria um espinho envenenado no coração. A terra, com os seus vestidos e as suas pregas, essa foi sempre generosa. É claro que nunca um panorama me interessou como gargarejo. (...) As dobras, e as cores do chão onde firmo os pés, foram sempre no meu espírito coisas sagradas e íntimas como o amor. Falar duma encosta coberta de neve sem ter a alma branca também, retratar uma folha sem tremer como ela, olhar um abismo sem fundura nos olhos, é para mim o mesmo que gostar sem língua, ou cantar sem voz. Vivo a natureza integrado nela. De tal modo, que chego a sentir-me, em certas ocasiões, pedra, orvalho, flor ou nevoeiro. Nenhum outro espectáculo me dá semelhante plenitude e cria no meu espírito um sentido tão acabado do perfeito e do eterno. (...) Eu declaro aqui a estas fundas e agrestes rugas de Portugal que nunca vi nada mais puro, mais gracioso, mais belo, do que um tufo de relva que fui encontrar um dia no alto das penedias da Calcedónia, no Gerez."

Miguel Torga, in "Diário (1942)"

Sem querer qualquer tipo de comparação com este grande Mestre (eu nunca a mereci...), descobri a melhor descrição para tudo aquilo que sinto, e sinto há muito tempo...
Desola-me a hipocrisia humana, principalmente a que começa por mim e que não consigo combater, seja por medo, covardia ou simplesmente por não querer fazer sofrer ninguém... Nem mesmo aqueles que não gostam de mim ou de quem não gosto tanto...
Só os penedos da Penha e o Mondego sabem o que sinto... Só a eles eu não sou capaz de esconder as verdades... Apenas eles conseguem ler a minha Alma, mesmo no choro apagado que surge do fundo do meu ser, sozinho para ninguém ver.
Mas só eles merecem a minha Lealdade... Só eles nunca me trairam com a sua eterna forma e vida infinita...
Da minha forma elementar e mineral, eu olho para ti meu Amor, e repudio mais uma vez o sentimento que não existe, que me negas com a tua rigidez...
Mantenho a sensação de ardor que queima as entranhas e me consome por dentro...
A minha tristeza será para sempre, tal como a minha solidão...

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Rochedo

Hoje queria ser um rochedo. Uma alta falésia encostada ao mar. Intransponível, imponente e impossível de mover.
Queria apenas as carícias do mar. Os beijos eternos das ondas, para poder esquecer os teus... Aqueles que nunca me deste...
Queria ser forte como não sou, não só mostrar e aparentar força... A força que sabes que não tenho, e fazes questão de me quebrar, atingir e destruir.
Queria não ter fraquezas e ser intransponível. Só para não sofrer por ti. Só para que tu provasses a sensação que é embater numa parede sem fim... Tal como eu bati... Na porta que abrias e logo a seguir fazias questão de fechar com grande estrondo.
Queria ser como uma falésia só para tu não te aproximares de mim... Para me respeitares...
Quero apenas amar o mar. Sonhar com a sua imensidão, sentir a brisa salgada, e alojar em mim eternos segredos de amor, de desespero, de desejo e de solidão... Quero a solidão de apenas ter as gaivotas como companhia, e acima de tudo quero ser o rochedo onde tu vais naufragar...
Não te desejo mal... Apenas antevejo o teu destino. O Futuro que crias na ilusão em que vives... Bem alto no teu pedestal...

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Loucuras

Tudo não passa de raiva! Raiva reprimida por aquilo que chamam amor... Por tudo aquilo que nos prende e impede de viver a nossa liberdade!
Noite dentro sem dormir, desejando não sentir... Torno o que sinto em raiva, e mais uma vez desejo a frieza e a inocuidade do não sentir...
Sinto a Raiva formar-se... Afinal o amor e o ódio andam sempre juntos e movem sempre os mesmos sinais e sintomas... E sou incapaz de lutar mais...
A minha Raiva dura pouco... Estou cansado e só me apetece fugir. Não tenho força para ter Raiva... Sinto-me desaparecer aos poucos. Sinto-me morrer por dentro, sem que alguém alguma vez sonhe o que me faz sofrer, o que me faz estar preso na minha liberdade.
A sensação de revolta mantém-se. Mas a voz está calada... Cada vez mais calada...
Choro sem razão e sem vontade, mas choro... Choro porque choro, porque não consigo falar. Nem sequer consigo arranjar, formar ou articular palavras para conseguir falar...
Não tenho força... Não me consigo mexer...
Quero dormir... Dormir muito... Dormir eternamente...

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Uma Vida - continuação

Se tu soubesses a dor que sinto por não te beijar, por te ver e não poder agarrar...
Cruelmente dilaceras o meu peito e sacas o meu coração ainda a bater. Brincas com ele antes de o deitares no foço profundo que é o esquecimento.
Não digas que não sabes o que sinto, ou a sensação do que vivo... Tu já por lá passaste... Falo na sensação porque ela motiva a memória quando o sentimento se perde ou se desfaz no tempo e no viver, ou quando apenas se torna numa sombra do que já foi.
Contigo nunca falarei de sentimento...
Contigo nunca falarei de pertença, mas sim de abandono. O abandono de quem mata uma preza e a deixa no mato para os lobos comerem. Ficas a ver e brincas, e gozas com o meu sentimento de cima desse teu pedestal inalcançável...
Contigo nunca falarei de paixão, mas falarei sempre de Fogo. De quem está no meio das chamas numa morte lenta e cruel... Mas sem nunca sentir calor, porque os teus olhos frios até isso tiram de mim...
Afinal o que queres? O que pretendes de mim? Que seja submisso, que mude, que morra? Da morte não tenho medo. O que me prende é apenas carne, porque a Alma já tu levaste e consumiste.
Pensava que da miséria da existência Humana tu te destacavas. A tua simples complexidade, o teu sorriso... Mas afinal és igual. Não passas de um predador oportunista, que escolhe a sua vítima na multidão, e cuidadosamente brinca até à exaustão...